28/07/2025 às 07h39

Transplantes no DF: a cirurgia que devolve o futuro aos pacientes

De janeiro a junho de 2025, foram 424 procedimentos, um aumento de quase 4% em relação ao mesmo período do ano passado

Michele Horovits, da Agência Saúde-DF | Edição: Natália Moura

Quando o telefone tocou pela oitava vez, Ingrid Aparecida Batista do Carmo, 32, ainda não tinha certeza, mas a sua vida mudaria a partir dali. Um novo fígado chegava. Era o órgão que diminuiria o mal-estar e as limitações, permitindo que o mundo voltasse a ser grande. “Foi um misto de alívio, medo e gratidão. Hoje, vivo uma outra fase. Consigo pensar em fazer uma viagem, voltar a estudar, trabalhar", conta, cheia de planos. 

Em 2021, Ingrid foi diagnosticada com hepatite autoimune e iniciou o tratamento no Hospital Regional de Ceilândia (HRC). Depois de dois anos, a terapia deixou de ser eficaz. “Passei a me sentir muito mal, não conseguia mais trabalhar. Então, fui encaminhada ao Instituto de Cardiologia e Transplantes do Distrito Federal (ICTDF). Logo na primeira consulta os médicos confirmaram que eu precisava de um transplante com urgência. Foi um choque”, lembra. 

Ingrid do Carmo aparece na foto com os pais. Ela recebeu um novo fígado em dezembro de 2024 e acredita que renasceu depois do transplante. Foto: Arquivo pessoal

 

O transplante veio no final de dezembro de 2024 e o passado foi virando o que deveria ser: memória e não presença. “Todos os dias eu vomitava. Vivia enjoada, sempre amarela, sempre mal. Depois do novo fígado, esses sintomas passaram. A equipe do ICTDF e a minha família fizeram toda a diferença. Sem eles, eu não seria nada. São pessoas iluminadas", destaca Ingrid.

Transplantes no DF

De janeiro a junho de 2025, a Secretaria de Saúde (SES-DF) realizou 424 transplantes, um aumento de quase 4% em relação ao mesmo período do ano passado. Os procedimentos envolvem órgãos e tecidos (rim, fígado, coração, córneas, pele e medula óssea), executados em unidades como o Hospital de Base (HBDF), Hospital Universitário de Brasília (HUB) e o ICTDF - este último por meio de contrato com a pasta. 

A rede pública de saúde da capital vem se destacando - e com exclusividades no DF: o transplante de pele, por exemplo, é feito apenas no Hospital Regional da Asa Norte (Hran). Já o de medula óssea pediátrico autólogo - no qual são utilizadas células-tronco do próprio paciente - é ofertado no Hospital da Criança de Brasília José Alencar (HCB). 
 

A rede pública de saúde da capital vem se destacando - e com exclusividades no DF: o transplante de pele, por exemplo, é feito apenas no Hospital Regional da Asa Norte (Hran). Foto: Jhonatan Cantarelle/Agência Saúde-DF


Doação 

No âmbito do DF, a coordenação das atividades de transplantes é feita pela Central Estadual de Transplantes (CET-DF). Sua atuação abrange tanto a rede pública quanto a particular. Dentre as responsabilidades do setor estão gerenciamento do cadastro de potenciais receptores, recebimento das notificações de morte encefálica, promoção da organização logística da doação e captação estadual e/ou interestadual, bem como a distribuição dos órgãos e/ou tecidos removidos na capital federal.

Nesse lado do processo, há um intenso e sensível trabalho, principalmente das equipes responsáveis pela captação dos órgãos. “O momento mais difícil é a entrevista com a família que perdeu alguém. É um instante de luto, de dor profunda. É preciso equilibrar o que deve ser feito, que é esclarecer a importância da doação, e a sensibilidade para não desrespeitar quem está sofrendo", explica a chefe do Banco de Órgãos do DF, Isabela Rodrigues, na área há 19 anos.
 

Especialistas e pacientes defendem que o sistema de transplantes precisa de consciência coletiva sobre doação. Foto: Jhonatan Cantarelle/Agência Saúde-DF


Apesar da distância ética que impede o contato direto com os receptores, alguns pacientes transplantados procuram a equipe para agradecer. “De vez em quando aparece alguém dizendo que só teve uma chance de viver melhor por causa daquela doação. É emocionante", diz a gestora. 

Especialistas e pacientes, contudo, defendem que o sistema de transplantes precisa de consciência coletiva. “Falta cultura de doação. Às vezes, a pessoa queria doar, mas a família não autoriza porque nunca conversou a respeito. "A gente precisa falar mais sobre o assunto, em casa, com amigos, como quem defende o amor à vida”, afirma Rodrigues.